Neste volume iniciamos a leitura com artigos ainda provenientes do desafio lançado aos preletores do 2º Congresso Luso-Brasileiro sobre o Pensamento de Donald Winnicott, realizado em Junho de 2014.
O desafio lançado no Congresso remetia para a importância da Retomada do Desenvolvimento, considerando-se esse o grande objetivo de uma Análise bem-sucedida.
Para que seja possível uma Análise bem-sucedida não basta apenas a técnica psicanalítica. A meu ver, a retomada do desenvolvimento só é possível porque, na relação com o analista, se sente, de forma inequívoca, como só o inconsciente pode saber, a aposta e o interesse do analista, que, na escuta atenta e interessada, sente esperança e prazer em estar/conhecer/ acompanhar as mudanças/dores/conquistas/decepções do seu paciente. Sem julgamento e sem expectativa. Mas com aposta no paciente. Com esperança no futuro e na realização pessoal do seu paciente, que, à sua medida, vai desvelando e criando o sentido da sua vida.
É a arte da nova relação que se instala entre aquele paciente e aquele terapeuta naquele momento das suas vidas, permitindo ao paciente uma experiência bem-sucedida de ser ouvido, compreendido e estimulado. Em minha opinião, o entusiasmo e o estímulo que o terapeuta demonstra, consciente e inconscientemente, pelo seu paciente, incentiva este último a assumir a sua agencialidade e conquistar o prazer e a realização pessoal na sua vida. Sozinhos sobrevivemos. Com o outro, conquistamos o prazer e o sentido de viver. Vivemos com o outro. Crescemos e expandimo-nos em sociedade. Porque o reconhecimento e o orgulho do outro são “alimentos” essenciais. É a procura da partilha e do olhar deslumbrado do outro que nos estimula a criatividade e a beleza das nossas criações. Sem o outro, o ascetismo basta.
Mas, entenda-se, esse estímulo, esse incentivo por parte do terapeuta não é o mesmo que delinear um caminho para o seu paciente. Nada disso. É um incentivo que nasce do profundo conhecimento do seu paciente, da sintonia com ele sentida. Trata-se muitas vezes de dar voz a desejos calados, bloqueados do paciente. Trata-se de dar voz ao paciente, numa escuta atenta daquilo que é dito de forma consciente e daquilo que se sente do que é dito de forma inconsciente - em meu entender, o self autêntico do paciente. Trata-se, pois, de dar significado a uma experiência emocional do paciente e potenciá-la. Colocar sobre ela o farol do analista, usando a bonita imagem que nos dá Coimbra de Matos.
Neste setting psicanalítico, setting de intimidade por excelência, partilham-se histórias dolorosas, traumáticas, como são o caso das histórias de abuso sexual de crianças. Neste volume, dois casos clínicos são apresentados. Um dos autores deixa-nos a inquietante questão de “Como pôde isto acontecer?” e conduz-nos a uma reflexão pertinente, senão mesmo inquietante, sobre a interferência das instituições no processo psicoterapêutico e o reconhecimento que é dado ao psicoterapeuta.
Pensar a Psicanálise e o Homem é sempre um processo dinâmico e desafiante e, neste volume, apresentamos um olhar sobre o modelo da mente, numa visão integradora e estimulante.
Outros artigos fazem parte da parte teórico/clínica deste volume, debruçando-se sobre a relação entre a identidade do sujeito e o seu trabalho e sobre os desafios que a adolescência coloca.
Neste volume, pode também encontrar-se uma parte clínica, onde os casos apresentados refletem a dinâmica da arte da relação psicanalítica: procura de sintonização, encontro e liberdade de ser.
No final, dois livros são comentados do ponto de vista psicanalítico. Espero que este volume vos agrade e vos estimule.
Catarina Rodrigues